Na década de 1990, a população carcerária do Rio Grande do Sul era de 11 mil presos. Hoje, supera 35,3 mil homens e mulheres. O aumento real médio, entre 2013 e 2016, por ano, é de 6,8% de pessoas presas. Se mantida essa tendência, o Estado terá, em 2027, uma população carcerária próxima de 60 mil presos e, em 2037, de 90 mil.
Os números que impressionam e evidenciam o colapso do sistema prisional gaúcho foram tema de encontro que reuniu Juízes das Varas de Execuções Criminais (VECs) em comarcas com presídios. O evento em março deste ano, no Palácio da Justiça, em Porto Alegre.
Ao final do evento, os magistrados divulgaram uma carta (leia abaixo), em que expressam sua preocupação com a atual e futura situação prisional do Estado e pedem a adoção de medidas efetivas por parte do governo gaúcho — o real gestor do sistema prisional.
O presidente da corte estadual, desembargador Luiz Felipe Silveira Difini, em sua manifestação de encerramento, salientou que a Carta dos Juízes da Execução Criminal reforça as maiores aflições daqueles que atuam na área. Se for mantida a atual tendência em termos prisionais, anteviu, a população carcerária deverá duplicar em até 10 anos. Ele disse que não vislumbra nenhuma iniciativa por intermédio do Executivo no sentido de criar alternativas para amenizar esta situação.
Conforme o chefe do Judiciário gaúcho, desde o começo do Governo José Sartori (PMDB), ingressaram mais de 5 mil novos presos, e nenhuma nova vaga foi criada, nem mesmo no Presídio de Canoas, em fase conclusão das obras.
Leia a carta:
‘‘Os magistrados da execução criminal do Estado do Rio Grande do Sul, reunidos em 14 de março de 2017 em Porto Alegre, com a finalidade de discutir a crescente taxa de encarceramento, a insuficiência de vagas em presídios e a ineficácia da pena de prisão, externam sua preocupação com a grave crise que assola o sistema prisional gaúcho, em especial por afetar diretamente a segurança pública e a vida em sociedade.
Os presídios do Estado, em maioria, estão superlotados, com taxas de ocupação de presos muito acima da capacidade de engenharia. Os efeitos da superlotação, somados à ineficiência do Estado, implicam não somente a violação de direitos da pessoa privada da liberdade, mas também o fortalecimento das facções e o aumento da criminalidade e da violência.
No Rio Grande do Sul, quase 7.000 presos encontram-se em prisão domiciliar por carência de vagas nos regimes semiaberto e aberto. Destes, 2.900 estão monitorados eletronicamente. Como se não bastasse, na Região Metropolitana de Porto Alegre, detentos têm permanecido irregularmente em carceragens de delegacias de polícia, em viaturas oficiais e até mesmo algemados em lixeiras e corrimãos de escadas, situação inaceitável.
Além disso, a população prisional gaúcha, que em meados da década de 90 era de 11.000 presos, hoje supera 35.300 presos entre homens e mulheres. Existe um déficit superior a 11.000 vagas.
Considerados os últimos 04 anos (2013-2016), constata-se um aumento real médio, por ano, de 6,8% de pessoas presas. Se mantida essa tendência, o Estado terá, em 2027, uma população carcerária próxima de 60.000 presos e, em 2037, de 90.000 presos.
Para absorver essa demanda, haveria a necessidade de disponibilizar no mínimo 2.500 vagas por ano, ao custo projetado e aproximado de R$ 60.000,00 cada uma, segundo valores informados pela SUSEPE, o que representaria um investimento anual de R$ 150.000.000,00, sem considerar o custo com manutenção dos estabelecimentos e a nomeação de novos servidores, o que parece inimaginável frente à crise financeira do Estado, que sequer logrou concluir, em dois anos, 5% faltantes da obra do Complexo Prisional de Canoas, com capacidade para 2.808 presos.
Não se ignora, também, a existência de aproximadamente 12.300 mandados de prisão pendentes de cumprimento, os quais, se cumpridos fossem, esbarrariam na falta de vagas no sistema prisional.
A propósito, nota-se que o elevado número de prisões não tem exercido qualquer freio à criminalidade. Ao contrário, tem servido apenas para fortalecer grupos criminosos, que ocupam os espaços relegados pelo Estado e exercem o controle de fato dos estabelecimentos, de lá comandando a prática dos mais variados crimes. Não por acaso, 70% dos indivíduos que ingressam no sistema prisional possuem, no mínimo, uma passagem anterior em algum presídio. Em outras palavras, o sistema se retroalimenta a partir de suas próprias deficiências.
O cenário, portanto, é crítico, inspira cautela e impõe a adoção de medidas urgentes e eficazes pelo Poder Executivo, responsável pela gestão do sistema prisional, para coibir a reprodução de rebeliões, como as recentemente ocorridas nos Estados de Roraima, Amazonas e Rio Grande do Norte.
No Rio Grande do Sul, desde dezembro de 2016, eclodiram rebeliões nos Presídios de Getúlio Vargas, Bagé, Três Passos, Carazinho, Sarandi, Uruguaiana e São Borja, das quais resultaram mortes, feridos e danos ao patrimônio público.
Advertimos, com base nas informações do mapa carcerário divulgado pela SUSEPE, que 30 presídios do Estado, de regime fechado, apresentam taxa de ocupação superior a 200% de sua capacidade de engenharia.
A persistir a inércia do Estado, corre-se o risco de outras rebeliões, talvez com resultados ainda mais graves e violentos e que ultrapassem, inclusive, os muros do sistema prisional, atingindo diretamente a população.
Alertamos que a construção de novos estabelecimentos prisionais, isoladamente, não basta. É preciso muito mais do que isso. Torna-se imprescindível assegurar condições mínimas e dignas para o cumprimento da pena privativa de liberdade, mediante oferta de trabalho e estudo e assistência à saúde. Do contrário, os presídios somente produzirão mais violência em prejuízo da almejada paz social.
Reconhecemos que o Tribunal de Justiça, na esfera de sua competência, tem empreendido esforços para amenizar a crise instalada no sistema prisional. Nesse sentido, destacamos a importância dos projetos que visam à criação de cinco Varas Regionais de Execução Penal e à implantação do sistema de videoaudiência, inclusive em estabelecimentos prisionais, bem como das políticas voltadas à realização de mutirões para agilização dos processos de execução criminal e à destinação de recursos oriundos das penas pecuniárias para projetos de relevo ao Estado, como a reforma do Instituto Psiquiátrico Forense no valor aproximado de R$ 5.000.000,00.
Informamos que, somente nos anos de 2014 e 2015, foram destinados pelos magistrados da execução penal quase R$ 9.000.000,00, provenientes das penas pecuniárias, a entidades vinculadas à segurança pública, especialmente para manutenção e ampliação de presídios e reaparelhamento das polícias.
Enfim, instamos o Poder Executivo a apresentar um plano de ação eficaz e reafirmamos nosso compromisso com a preservação da ordem pública, com o respeito aos direitos e deveres da pessoa privada da liberdade e com o cumprimento da Lei de Execução Penal e da Constituição Federal.’’
Porto Alegre, 14 de março de 2017.
São 2865 futuros servidores aprovados em concurso publico recente mas, por morosidade do governo do Estado através de seu secretario de segurança Cesar Schirmer até agora nada. Como se não bastasse ameaça expandir a aberração institucional de aumentar o numero de policiais militares dentro do sistema prisional. Como fica claro na carta dos juízes acima, esse concurso já teria que ter sido concluído e outro já iniciado.