Por Marcos Correa:
‘Se alguém quiser saber o nível de civilização de uma sociedade, basta conhecer o seu sistema prisional’
Fiodor Dostoiévski
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A rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) em Manaus, desnuda mais uma vez a verdade que ninguém quer ver e que há muito vem sendo denunciada por nós sindicalistas ligados a área dá segurança pública. Qual seja, o esgotamento total do atual modelo de gestão, se é que existe um, do sistema prisional em nível nacional e estadual.
Ganhamos às primeiras páginas dos principais jornais do país inclusive da ZH que há anos faz campanha contra a SUSEPE e a favor da privatização no sistema prisional gaúcho da forma mais irresponsável possível. Agora, silêncio! Enfim, colunistas opinam, gráficos explicam, especialistas analisam e operadores do sistema são ouvidos. Contudo, não há um parágrafo sequer informando, definitivamente, que o Compaj é administrado pela iniciativa PRIVADA.
No caso do grupo RBS, li uma linha em que ZH cita em uma das sua matéria uma atividade, muito vaga, da Agência Brasil nesse sentido, leiam: ‘Procurada pela Agência Brasil, a empresa Umanizzare, contratada pelo governo para administrar a unidade, não comentou a situação’, ZH 02/01/2017. Vejam o grau de escárnio com a opinião pública, que por abvio, não é por acaso, pois privatizar para o grupo RBS e o governo Sartori/PMDB seria a solução para o caos no sistema prisional gaúcho. Inclusive como promessa de campanha da coligação ‘Todos pelo Rio Grande’ que prometia privatizações no sistema penal.
Grande parte do que ocorre no sistema prisional é simplesmente atribuído às guerras de facções como vimos em Manaus. Ora, esse é o maior atestado de incompetência possível. Analizemos, como assimilar essa informação? Impossível, pois se partirmos dessa premissa, a sociedade deveria reclamar, não dos gestores, políticos e Judiciário, mas sim, dos líderes das facções como PCC, CV, BALA e ANTI-BALA por eles gerirem mal, não manter a ordem dentro do sistema prisional brasileiro e possibilitarem esses tipos de atrocidades. Lamentável, mas é dessa forma irresponsável que a imprensa, salvo raras exceções, vem abordando a bomba relógio que é o sistema prisional gaúcho e brasileiro.
Dentro dessas honrosas exceções, está a informação divulgada pelos Jornalistas Livres:
” O governador do Amazonas, José Melo (Pros), firmou em 2015 um “contrato de R$ 205,9 milhões para concessão de cinco unidades prisionais por 27 anos, prorrogáveis até o limite de 35 anos”. O contrato é com o “Consórcio Pamas – Penitenciárias do Amazonas, a Umanizzare Gestão Prisional e Serviços e a LFG Locações e Serviços Ltda”.
O texto diz ainda que “a Umanizzare, que em 2014 recebeu do governo amazonense R$ 137.284.505,62, prometia, como o seu nome já diz em italiano, ‘Humanizar’ os detentos”, e que a empresa, ao assumir a unidade na qual, ontem, presos foram decapitados, também esquartejados, tinha “o intuito de empregar diversas práticas e ações já desenvolvidas em outras unidades prisionais geridas por ela e que amenizam a condição de cárcere do detento”.
As informações divulgadas pelos Jornalistas Livres vêm insinuadas, apenas, no pé da matéria do Valor, abaixo do entretítulo em negrito que fala em “R$ 900 milhões para entidades”. “O governador foi indagado sobre os pagamentos de cerca de R$ 900 milhões entre 2010 e 2016 para duas entidades de direito privado que passaram a administrar presídios do Amazonas”, informa o texto, que em seguida vem com a justificativa de José Melo para a medida, algo sobre garantir a comida dos detentos, até que sem nome de empresa nem contrato específico, a matéria termina.”
Outra mazela que envolve qualquer tipo de privatização, é a promiscuidade entre o público e o privado. O popular, toma lá dá cá! Na prática, é mais um canal de possibilidades pra o desvio do dinheiro público para o setor privado. Com grande margem para descaminhos. Através de políticos corruptos e carreiristas que vão, das formas mais nefastas, garantir recursos para campanhas e a manutenção dessas aberrações que são as privatizações de atividades exclusivamente de Estado. Hoje reclamada para o mercado por liberais de pouca estatura aqui no RS.
No caso de Manaus, no massacre de Compaj, não podia ser diferente, é exatamente esse o modus operandi que facilitou o massacre de 56 presos no último final de semana. É notícia já, que os acionistas da Umanizzare Gestão Prisional e Serviços LTDA, Regina Celi Carvalhães de Andrade e Arleny Oliveira de Araújo, doaram 212 mil reais ao Dep.Carlos Souza (PSD/AM) que inclusive já foi até Vice-prefeito de Manaus e atualmente é Presidente da Junta Comercial do Estado do Amazonas nomeado em 2015 pelo atual governador, José Melo (Pros). Claro que tudo dentro da lei as doações, mas da forma mais imoral e suja que possamos imaginar.
Enfim, todo o ataque despropositado, simplista e desprovido de fundamentos lógicos de alguns setores da sociedade gaúcha que ouvimos na semana que antecedeu a tragédia de Manaus. Contrasta hoje com um silêncio infantil de gente irresponsável e oportunista que perdeu a oportunidade de ficar calado. Não tem solução simples, o problema é complexo e os atores desse palco de horrores são muitos mas, todos precisamos ouvir e ser ouvidos. Para só assim construir uma alternativa de mudança para essa realidade e que seja factível. Só assim, talvez, possamos evitar o que vimos em Pedrinhas, Manaus, Florianópolis, São Paulo e tantos outros lugares. Não queremos que aconteca qui no nosso sistema prisional gaúcho nenhuma barbari. É hora de atitudes e responsabilidade de todos envolvidos.
Marcos Correa
Diretor de Comunicação Amapergs Sindicato